domingo, 21 de agosto de 2011

Portugal e a 1ª Guerra Mundial

 
A 5 de agosto de 1914 toda a Europa estava em Guerra. No dia 2 desse mês, em Portugal começaram-se a fazer sentir os efeitos psicológicos da guerra: a moeda de prata desapareceu de circulação, as mercadorias subiram de preço e deu-se uma corrida aos bancos para levantar o dinheiro.
A par do pânico da população, o Governo não sabia o que fazer.
No dia 7 de agosto, o Governo de Bernardino Machado levou ao Congresso da República uma declaração sobre a política externa a seguir face à emergência da guerra. Esta declaração reafirmava a tradicional aliança com a Inglaterra sem declarar guerra à Alemanha.
Porém, apenas cinco dias depois, Portugal organiza uma expedição militar com destino a Angola e Moçambique, começando, desta forma, a combater não na Europa, mas em África, isto é, a posição de Portugal na Primeira Guerra Mundial não se podia separar da defesa das colónias ultramarinas, já que as ambições da Alemanha sobre estas eram bastante grandes.
Assim, numa primeira etapa, Portugal participou, militarmente, na guerra com o envio de tropas para a defesa das colónias ameaçadas pela Alemanha. Face a este perigo e sem declaração de guerra, o Governo português enviou contingentes militares para África.
Mesmo antes de eclodir a guerra, o tratado anglo-alemão de 1898 previa uma partilha de Angola, Moçambique e Timor, já que devido às dificuldades financeiras de Portugal, provavelmente, este país se veria obrigado a empenhar as colónias para resolver a crise.
Em 1913, os mesmos países que integraram este tratado celebraram em 20 de outubro um tratado de revisão do anterior.
Porém, as pretensões da Alemanha não chegaram a realizar-se, devido à ação diplomática portuguesa em Londres e também porque os alemães não concordaram com a exigência por parte da Inglaterra de lhe dar protagonismo.
Assim, com o eclodir da guerra, as possessões portuguesas em África ficavam, novamente, à mercê das ambições da Alemanha.
A 25 de agosto de 1914, os militares alemães fizeram uma incursão ao Norte de Moçambique.
Em 11 de setembro, Portugal envia a primeira expedição militar para as colónias.
No final de 1914, Portugal estava em guerra não declarada com a Alemanha no Sul de Angola e no Norte de Moçambique.
Contudo, a declaração de guerra era previsível.
Começam aqui as divisões na união política nacional. As opiniões acerca da entrada de Portugal no conflito dividiam-se cada vez mais.
A Grande Guerra marcou, assim, os destinos da Primeira República Portuguesa, a partir de 1914.
Por um lado, surgem os evolucionistas de António José de Almeida, indecisos, embora a partir de 1916 partilhassem as responsabilidades de Portugal entrar na guerra. As suas ideias guiavam-se no sentido de acompanhar a Inglaterra; por outro lado, surge Brito Camacho que se opôs à intervenção de Portugal. Chefe dos unionistas, defendia, porém, o reforço militar nas colónias e o facto de Portugal se pôr ao lado da Inglaterra que era aliada, prestando-lhe todo o auxílio que ela pedisse, desde que Portugal pudesse dar-lho. Adotava, assim, uma política de neutralidade. O Ministério dos Negócios Estrangeiros de Bernardino Machado acolheu esta ideia, onde o seu titular, Freire de Andrade, adotou uma política de neutralidade condicional.
Por outro lado, surgem os democráticos e intelectuais republicanos, onde se destaca João Chagas, que defendiam a participação de Portugal no confronto. Estes intervencionistas viam na guerra a oportunidade de afirmação da autonomia de Portugal há muito submetido ao protetorado inglês. Afonso Costa, por seu lado, defendia a intervenção militar de Portugal ao lado da Inglaterra, isto é, a intervenção portuguesa estava condicionada pela prévia invocação por parte da Inglaterra das condições da aliança com Portugal.
O papel da República Portuguesa face à guerra significava a continuação da diplomacia por outros meios, isto é, desde 1910 que a política externa de Portugal foi feita no sentido da manutenção das boas relações com a Inglaterra, pois ajudava a consolidar o novo regime internacionalmente, já que nenhum Estado europeu, a não ser as repúblicas latino-americanas, reconheceu a República Portuguesa antes da Inglaterra em 1911, quando foi eleito Manuel de Arriaga como presidente.
Em 4 de agosto de 1914, o Foreign Office, ou Ministério dos Negócios Estrangeiros Britânico, declarou que não julgava propício que o Governo português declarasse a neutralidade ou a guerra, isto é, o Governo inglês, no caso de precisar que Portugal interviesse, pediria o seu auxílio, mas não se comprometia a defender militarmente o país e as suas colónias caso Portugal decidisse entrar na guerra sozinho.
Porém, nos últimos meses de 1914, a situação interna e externa de Portugal definiu-se no sentido da intervenção. A primeira solicitação estrangeira feita a Portugal, com intuito militar, partiu da França, em setembro de 1914, que queria que Portugal pudesse participar com a sua artilharia e infantaria.
Os ingleses apoiaram o pedido e, em 10 de outubro, o Foreign Office convidou o Governo português a fazer parte dos Aliados.
A 14 deste mês, Freire de Andrade comunicava às legações portuguesas na Europa que era certa a entrada de Portugal na guerra como aliado da Inglaterra.
Decorridos cinco dias, a 19 de outubro, um incidente ocorrido em Angola com tropas alemãs confirmou este envolvimento.
No dia 20 surge uma revolta em Mafra de cariz monárquico que era contra a ida para a guerra, surgindo, deste modo, a primeira resistência à mobilização militar. Cerca de um mês depois, a 23 de novembro, o Congresso reuniu extraordinariamente por ordem de Bernardino Machado, para obter autorização para intervir no confronto, quando e como achar necessário, como nação livre e aliada da Inglaterra. Dois dias volvidos é feita a mobilização.
Apesar da unanimidade com que foi votada a declaração de 23 de novembro, na prática não se revelou da mesma forma. As dificuldades financeiras e logísticas que antecediam os preparativos revelaram dúvidas quanto ao rápido desfecho da guerra.
Novas divergências políticas surgiam entre os republicanos. O Partido Democrático dizia ser o momento para formar um governo de unidade republicana sob o seu comando, acabando, desta forma, com o afastamento do poder de Bernardino Machado em 5 de dezembro de 1914.
Entre dezembro e janeiro de 1915, a República estava num caos. As condições para uma União Sagrada ainda não tinham sido encontradas. O Partido Democrático teve de assumir a responsabilidade, sozinho, de gerir um ministério que necessitava, novamente, de eleições. Desta forma, Afonso Costa também não quis assumir a chefia do Governo, encarregando o presidente da Câmara dos Deputados, Vítor Hugo de Azevedo Coutinho, de assumir a chefia de um governo parlamentar. Porém, até os unionistas abandonaram os seus mandatos parlamentares.
Machado Santos renuncia ao mandato, aprovando o Senado, entre o qual se encontrava Bernardino Machado, uma moção de desconfiança ao executivo.
Este governo, que ficou conhecido pelo governo de "Os Miseráveis", durou pouco. O presidente da república Manuel de Arriaga, demitiu este ministério em 24 de janeiro de 1915, entregando o poder em ditadura ao velho general Pimenta de Castro.
Esta ditadura insere-se no contexto de intervenção de Portugal na guerra, colocando no poder não só os adversários do Partido Democrático e do Partido da Guerra como os críticos do parlamentarismo liberal e a ala mais conservadora da hirarquia militar, abrindo-se, desta forma, uma fase de relações conturbadas cívico-militares.
Em 1915, as dificuldades económicas e sociais provocadas pela conjuntura de guerra começaram a fazer-se sentir: certos géneros alimentares começaram a falhar e os seus preços subiram, originando revoltas populares nas principais cidades de Portugal.
Nos finais de 1915, os Aliados preparam uma ofensiva para o início do ano seguinte.
A 29 de novembro de 1915, Afonso Costa forma o seu segundo governo e é empossado pelo novo presidente da República, eleito pelo Congresso em 6 de agosto de 1915 e investido a 5 de outubro: Bernardino Machado.
Em 30 de dezembro, o Foreign Office perguntava ao Governo português se estava disponível para começar o resgate dos navios mercantes alemães que se encontravam nos portos portugueses da metrópole, colónias e ilhas.
Desta forma, Afonso Costa, já em janeiro de 1916, tenta que a Inglaterra autorize Portugal a declarar guerra à Alemanha, antes da apreensão dos navios, mas em vão.
A 23 de fevereiro, o Governo português ordenou a apreensão dos navios alemães no porto de Lisboa. No dia 9 de março, a Alemanha declara guerra a Portugal. Seis dias depois, António José de Almeida assume a chefia do governo, enquanto Afonso Costa fica com as Finanças. A partir de março, o governo tem como prioridade a organização de um Corpo Expedicionário.
A resistência organiza-se: infrações à disciplina militar, a revolta de 13 de dezembro de 1916 encabeçada por Machado Santos, etc. Norton de Matos que, em março de 1916, ocupa a pasta da Guerra, partidário da intervenção de Portugal na Primeira Guerra organiza em tempo "recorde", conjuntamente com o general Tamagnini, a Divisão de Instrução em Tancos, da qual resulta o Corpo Expedicionário Português (CEP). Este episódio ficou conhecido como o "milagre de Tancos".
O primeiro Corpo Expedicionário partiu em 26 de janeiro de 1917 para a Flandres. Este corpo perdeu muitos homens devido aos bombardeamentos alemães, ao confronto homem a homem, à utilização de gases venenosos por parte do inimigo e à estadia prolongada das tropas em combate, já que Sidónio Pais se recusou substituí-las.
À medida que o número de mortes vai aumentando no Corpo Expedicionário e o seu fim era previsível, a guerra tornava-se cada vez mais impopular.
O custo de vida aumentava, o abastecimento de géneros escasseava e o desemprego crescia. Estes fatores fizeram despoletar violentas reações sociais (greves e assaltos) que eram aproveitadas pelos unionistas e monárquicos, contrários à intervenção de Portugal no confronto armado e defensores da retirada das tropas portuguesas dos campos de batalha.
A este agravamento das condições de vida e da agitação social e política, Afonso Costa não apresentava soluções, recusando a entrada no governo de elementos de outros partidos republicanos, católicos e independentes.
As oposições à guerra que vão surgindo em Portugal misturam-se com divergências políticas. A agitação social sai às ruas e o Governo tenta reprimi-la.
Em 20 de maio de 1917, o Governo suspende as garantias e, em 12 de julho, é declarado o estado de sítio em Lisboa, na sequência de greves e motins. A 8 de setembro é convocada, pela União Operária Nacional, uma greve geral.
Após 1917, as greves, a luta armada, as prisões e as perseguições somam-se por todo o lado.
O terceiro governo de Afonso Costa tentou obter o apoio dos trabalhadores e sindicatos que eram adversários da política de guerra. Porém, o aumento dos salários era menor que o aumento do custo de vida e que a desvalorização da moeda.
Este governo de Afonso Costa teve também de enfrentar a oposição das camadas populares afetadas e amotinadas contra a diminuição no abastecimento dos géneros e sua rarefação e também com a oposição dos possidentes e conservadores que receavam as perturbações sociais que o Governo não conseguia controlar.
Para além destas, teve de contar com a oposição da Igreja, que o Governo pretendia culpar por causa da nova onda monárquica e com a oposição da província que não estava satisfeita com a atuação do Governo na política de distribuição e na paralisação da política de obras públicas.
Por outras palavras, cresce a base social da oposição e diminui a base política apoiante do governo. Por outro lado, na Flandres, o Corpo Expedicionário conhecia o seu esmagamento. No dia 4 de abril de 1918, as tropas amotinavam-se em pleno campo de batalha.
O Corpo Expedicionário vivia dias de horror e inferno: do dia 9 para 10 daquele mês, quando a 2ª Divisão do Corpo Expedicionário Português retirava dos campos de batalha para ser substituída, sofreu um dos maiores bombardeamentos do exército alemão, acabando quase por desaparecer. Era o princípio do fim da guerra para os portugueses.
O Corpo Expedicionário Português retirou-se para a retaguarda dos Aliados. Alguns efetivos integraram o exército inglês e outros foram utilizados como mão de obra para abrir trincheiras, o que foi desmoralizando, cada vez mais, os soldados lusitanos.

in Infopédia. Porto: Porto Editora, 2003-2011.

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