sexta-feira, 5 de março de 2021

As Febres do Século




 Não se sabe onde surgiram os primeiros casos da gripe que dizimou cinco por cento da população mundial. Facto é que se propagou nas trincheiras durante a Primeira Grande Guerra.

O nome de Gripe Espanhola deve-se a ter sido neste país que surgiram as primeiras notícias sobre a pandemia. Pela sua neutralidade no conflito, Espanha não censurava as notícias, daí as publicações sobre a doença que outros países beligerantes escondiam por motivos de segurança.

As pandemias têm acompanhado a história da Humanidade. A mais próxima da COVID-19, em dimensão e gravidade, foi a Pneumónica, com três vagas entre 1918 e 1919. Provocou um número tão avassalador de mortos que ultrapassou o das vítimas estimadas para a Primeira e Segunda Guerras Mundiais.

Em Portugal, o rasto da experiência humana deixado por esta esta devastação e os conceitos científicos e técnicos que a equipa liderada por Ricardo Jorge protocolaram, viriam a ser a base do pensamento de saúde pública. Um mal que “quase instantaneamente se derrama por uma cidade inteira e salta por cima de todas as barreiras”. Desta forma se referiu ao vírus mortífero, em 1918, Ricardo Jorge, director-geral da Saúde, que em Portugal liderou o combate à grande febre do século. E constatou que “… não fica mal deixar de visitar enfermos (…) e também não fica mal acabar com os cumprimentos de uso – apertos de mão e ósculos de cerimónia, gestos que repugnam à higiene e até à cultura, restos que são do passado selvagem (…) e logo coisas tão polutas como beiços e dedos”. Qualquer semelhança destas sugestões com a realidade, em futuras epidemias respiratórias, não são coincidência.

O distanciamento físico, bem como os confinamentos ou as cercas sanitárias são medidas adoptadas até hoje para combater a propagação de doenças. Para limitar o contágio promoveu-se a lavagem das mãos e o uso de máscaras, a desinfeção de casas e de ruas. Foram adotadas restrições à atividade económica e social: proibidas as feiras, fechadas as escolas e canceladas as peregrinações. Mas o desastre estava em marcha. As morgues encheram-se, os funerais realizavam-se à noite, para evitar aglomerados, e nos cemitérios, por falta de espaço, abriram-se valas comuns. Da mesma forma que 100 anos depois, com a Covid-19, os serviços de saúde não foram suficientes para tamanha catástrofe. Além das Misericórdias, só havia em Portugal dois hospitais públicos: em Lisboa e em Coimbra.

É à Cruz Vermelha que cabe um papel essencial: médicos, enfermeiros e voluntários asseguram o funcionamento de hospitais de campanha montados em escolas e conventos.

A Pneumónica foi a maior pandemia do século XX. Estima-se que tenha provocado largas dezenas de milhões de mortos. Portugal ultrapassou os 100 mil óbitos entre pouco mais de seis milhões de habitantes. Atingiu particularmente jovens adultos que morreram de pneumonia.

Só décadas mais tarde veio a descobrir-se que foi causada pelo subtipo A da gripe, o vírus H1N1, que voltaria em força já no século XXI. Não se sabe onde surgiram os primeiros casos da gripe que dizimou cinco por cento da população mundial. Facto é que se propagou nas trincheiras durante a Primeira Grande Guerra.

O nome de Gripe Espanhola deve-se a ter sido neste país que surgiram as primeiras notícias sobre a pandemia. Pela sua neutralidade no conflito, Espanha não censurava as notícias, daí as publicações sobre a doença que outros países beligerantes escondiam por motivos de segurança.


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